Mokuso

Em vários dojo, essa palavra é gritada como um bramido de guerra. Ela é dita duas vezes, no início de uma sessão de prática e novamente no fim, sempre depois que os alunos se alinharam e estão sentados em silêncio, em seiza. Para que eles entrem em posição, normalmente são dados outros comandos. “Yame” ou “Keiko osame” é dito quando a sessão termina. Narande significa “alinhem-se”. Seiretsu ou keiretsu são comandos para os alunos se alinharem de acordo com a graduação. Chakuza significa ficar de joelhos e assumir a posição sentada, seiza. Após estarem todos sentados, há um longo momento de acomodação até que os barulhos e o som da respiração agitada depois da prática cessam, seguido por um silêncio que é quebrado pelo grito que parece penetrar diretamente nos corpos dos que se encontram sentados.

MOKUSOOO!!!

O moku de mokuso significa “silenciar”. So significa “pensamento”. Às vezes, imagina-se o mokuso como um período de “meditação”. De certa forma, é.Mas uma maneira de melhor vê-lo é como um período de transição. Muitos acreditam que o dojo é um lugar de refúgio, um lugar em que as preocupações do dia podem ser colocadas de lado. No entanto, isso pode levar a ideias incorretas. O dojo não é um lugar de fuga da vida diária. Na verdade, ele é um lugar em que se pode confrontar a realidade da vida diária, encontrá-la de forma concentrada e aprender a lidar com ela. O dojo é um microcosmo intensificado de nossa existência e das atividades do dia a dia. Assim, aproximamo-nos do que ocorre lá dentro com um foco maior e com mais intensidade em relação às outras áreas de nossas vidas. Isso requer um período de transição, e é isso que o mokuso representa. Quando começamos, o período de mokuso nos permite silenciar nossas irritações, preocupações, desejos e preconceitos que temos fora do dojo, colocando-os de lado durante o período de prática. Quando terminamos o treino, outro período de mokuso nos ajuda a retornar, voltar para nossas vidas do lado de fora do dojo. Não há nada particularmente “místico” nem mesmo transcendental no mokuso. Não estamos buscando iluminação como faria um monge zen. Estamos apenas transitando, nos movendo de um lugar para outro – nem especial nem extraordinário, mas ambos são partes fundamentais do nosso dia.

E sobre o que pensamos aos nos sentarmos para o mokuso? Se você perguntar, o professor dirá “não pense em coisa alguma”. É mais fácil falar do que fazer. Os pensamentos se amontoam, se empurram buscando nossa atenção. Ficamos pensando, ao começarmos a aula em mokuso, se talvez não deveríamos ter faltado à aula nessa noite. “Tenho de fazer o relatório do trabalho da escola, esqueci de lavar a roupa a semana toda”. Quando terminamos, e estamos sentados novamente, estamos preocupados se fomos bem no treino. “Será que o sensei ficou satisfeito? Estou melhorando?” É muito difícil afastar esses pensamentos. Tentar evitá-los parece fazer com que eles venham com muito mais força. Sob tais circunstâncias, devemos pensar em um conceito chamado chado, o Caminho do Chá. “Ichi-go, ichi-e” significa “cada encontro, uma chance”. Durante o seu dia fora do dojo, você teve chances de fazer suas tarefas que deviam ser feitas e a oportunidade de interagir com outras pessoas. No dojo, é a mesma coisa. Essa sessão de prática só ocorre uma vez em sua vida. Da próxima vez, mesmo que seja na mesma noite, você estará diferente, a lição será diferente. O mesmo vai acontecer, é claro, em sua vida do lado de fora do dojo. Cada momento é único. No mokuso, temos a chance de pensarmos. Eu fiz o melhor em cada momento antes de vir para o dojo? No dojo, e depois de terminada a prática, podemos refletir novamente. Usei cada momento da aula ao máximo? Se a resposta é sim, podemos ficar felizes. Se não, a próxima aula, o próximo dia, nos dará a oportunidade para tentarmos novamente. Podemos nunca chegar a atingir o estado de “não mente” da quietude do mestre zen em nosso mokuso. Mas se usamos esse período de mokuso para percebemos a natureza transitória de nosso mundo e a aceitamos, então esses momentos nunca serão desperdiçados.

Texto extraído do livro “O Dojo” de Dave Lowry,

tradução Jaqueline Sá Freire

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